terça-feira, 3 de julho de 2012

Crise assombra o Oeste

Fonte Diário Catarinense...


Crise assombra o Oeste
DARCI DEBONA
Produtores estão abandonando a atividade e 10 cidades decretaram situação de emergência
Criadores com suínos gordos sem ter para quem vender, criadores chorando por ter que abandonar a atividade que exerciam há décadas, gente com dívidas que não consegue pagar, chiqueiros que estão sendo transformados em estufa, galinheiro ou então depósito e municípios decretando situação de emergência.
Esta é a realidade da suinocultura catarinense, uma das principais atividades econômicas do Estado, que somente em exportações movimentou US$ 452 milhões no ano passado.
A situação da família Altenhofen, de Xavantina, é desesperadora. Eles acumulam uma dívida de R$ 200 mil com a criação e agora estão vendendo a terra. No mês passado, Natalino Altenhofen entregou as 80 reprodutoras por um real ao quilo, pois não tinha mais milho para alimentar os animais. Sobraram quatro porcas de descarte e oito vacas de leite, que dão o sustento para a família.
Um filho que ajudava na criação foi trabalhar de empregado em outra propriedade. A filha Rosane, que ainda está em casa, pensa em ir trabalhar de diarista ou numa padaria. E o casal Natalino e Rosália tenta vender a propriedade por um valor que, pelo menos, cubra as dívidas.
– Senão vamos pra debaixo da ponte – afirma Altenhofen, que está com 65 anos e ainda enfrenta problema de saúde em um olho e nos rins.
Nas últimas duas semanas, 10 municípios decretaram situação de emergência: Braço do Norte, Seara, Xavantina, Grão Pará, Arroio Trinta, São Ludgero, Salto Veloso, Lindoia do Sul, Orleans. Ontem foi a vez de Concórdia decretar emergência. Outros municípios estudam a mesma medida.
Os decretos precisam ser reconhecidos pela Defesa Civil, mas o principal objetivo, segundo o secretário de Agricultura de Concórdia, Márnio Cadore, é dar apoio aos produtores e sensibilizar as autoridades, pois as perdas do setor impactam também na economia destes municípios, com reflexo no comércio e na arrecadação.
– O primeiro impacto é no social, mas depois começa a influenciar na arrecadação – explica o secretário de Agricultura de Seara, Fred Müller.
– Se o governo não der uma mão, a suinocultura está com os dias contados – sentencia o produtor Sigmar Ruppenthal, que está com cerca de 700 leitões e não consegue vendê-los.
Ele entregava os animais com oito quilos e alguns já estão com quase 40 quilos.
– Ninguém quer – lamenta.
Ruppenthal vendeu suínos a R$ 2,50 por quilo há um ano e, recentemente, negociou algumas reprodutoras a R$ 0,94 por quilo. Ele diz que as economias que tinha acumulado se foram, pois a despesa mensal na criação é de R$ 28 mil a R$ 30 mil.
O suinocultor Moacir Mattielo decidiu que vai terminar com a criação. Ele tinha 70 porcas e restam apenas 30, que devem ser vendidas até o final do ano.
– Não tem mais o que fazer – decreta.
Seu filho, que ajudava na criação, foi trabalhar na cidade de Seara. E um dos chiqueiros que Mattielo tinha está sendo desmanchado.
– Vou fazer uma estufa para cultivar tomate – diz.
Para o diretor da Embrapa Suínos e Aves, de Concórdia, Dirceu Talamini, o aumento na produção nacional e o excesso de suínos no mercado, aliados às restrições da Argentina, fizeram o preço despencar. Por outro lado, os custos de milho e soja aumentaram muito. A Embrapa calcula o custo em R$ 2,57 por quilo, para uma remuneração de R$ 1,90.
O presidente da Associação Catarinense dos Criadores de Suínos, Losivânio de Lorenzi, afirma que SC já teve 70 mil suinocultores na década de 1970 e hoje tem cada vez menos. Só neste ano, 240 produtores desistiram. O setor pede ao governo federal a renegociação de dívida e financiamento de R$ 500 por matriz para manter os plantéis. Também querem subsídio de 67 centavos por quilo de suíno vendido, que é a diferença entre o custo e o preço de mercado.
Saída é transferir a criação
A cada crise, Santa Catarina vai perdendo produtores especializados na criação de suínos. Alguns abandonam a atividade, outros vão tentar a sorte longe de casa. É o caso de Adair Cella, que há cinco anos fechou os chiqueiros em Chapecó, onde tinha 200 fêmeas que produziam 4 mil leitões por ano. Ele e mais seis sócios, sendo cinco do Oeste de Santa Catarina e dois que estavam no Mato Grosso, montaram uma granja de suínos em Tapurah (MT).
Foram investidos R$ 30 milhões na estrutura, que abriga 170 funcionários e uma produção de 324 mil suínos por ano. Cella diz que a opção foi em virtude das dificuldades ambientais e custo de produção, já que o milho é mais barato no Centro-Oeste.
Modelo está com os dias contados
Além disso, no Mato Gosso o modelo de produção é diferente. Em Chapecó, ele era responsável pelos insumos e lá a remuneração é por leitão produzido, sendo que os insumos e assistência técnica são bancados pela agroindústria.
Ele vê que o antigo modelo de produção familiar, em pequena escala, não sobreviverá. Na comunidade de Colônia Cella, onde continua morando com a família, Adair lembra que, em menos de 10 anos, restaram apenas cinco dos mais de 20 criadores de suínos da região.
– Se eu tivesse ficado aqui, teria fechado igual o chiqueiro – lembra.
Chiqueiro vira loja de roupa
A estrutura de uma propriedade modelo na criação e suínos na década de 1970, na Linha Fragosos, em Concórdia, atualmente serve para outro tipo de criação: roupas de moda.
A granja foi desativada há mais de duas décadas, em outra crise da suinocultura. Até que, em 2008, o casal de administradores Odílio Lins Júnior e Mônica Brancher Lins decidiu transformar as pocilgas numa fábrica. Eles tinham indústria e quatro lojas em Florianópolis, onde pagavam R$ 12 mil de aluguel por mês.
Odílio decidiu utilizar os chiqueiros abandonados pelo seu pai para produzir novamente. Onde era a maternidade dos porquinhos, foram retiradas as baias e instalada uma loja.
Estilo rústico atrai os clientes
A estrutura das paredes e o teto permanecem, o que alia o rústico à leveza das peças vendidas no local.
– Os clientes adoram – diz Mônica.
Em outro galpão que servia para criação fica a sala de cortes, não de carnes, mas de tecidos. Os troféus que o sogro de Mônica conquistou na produção agropecuária agora servem de peso para os moldes de papel.
O que foi considerado loucura por amigos, só trouxe benefícios. Como eles moram ao lado da indústria, podem atender melhor aos dois filhos, e a produção, em vez de minguar, triplicou. O Grupo Lemon, que tinha 11 colaboradores em Florianópolis, agora conta com 24. E, neste mês, deve abrir uma loja da marca Maria Catarina em Chapecó. Se o porco não estava mais dando lucro, a produção de roupas vai muito bem.


CONCÓRDIA
Investir para ganhar em escala
Enquanto muitos suinocultores estão reduzindo o plantel ou até desistindo da atividade, o produtor Marcos Ruppenthal está fazendo o caminho contrário: investiu R$ 700 mil no aumento da produção.
– É no momento da crise que tem que investir – aposta o criador de suínos de Arabutã.
Ele tinha 140 matrizes reprodutoras de suínos e, até o final do mês, já terá 500. Desta forma, a produção de leitões vai quase quadruplicar. Para isso, ele teve que construir dois chiqueiros automatizados e novos sistema de tratamento de dejetos. Metade do dinheiro investido é de recursos próprios, e o restante, é financiado.
Adaptação a uma nova realidade
O suinocultor explicou que não está cometendo nenhuma “loucura”, e sim se adaptando a uma nova realidade do mercado. Antes, os suínos eram dele, que era responsável por todas as despesas. Pelo novo sistema, todos os animais são da agroindústria e é ela a responsável por fornecer a ração, medicação e transporte dos animais. O produtor só alimenta e cuida dos animais.
O vice-presidente da Aurora Alimentos, Neivor Canton, disse que cerca de 90% dos 3,2 mil suinocultores da cooperativa já estão nesse sistema, que é denominado “vertical”.
– Só a Aurora tem mais de 1 milhão de suínos – calcula.
Ruppenthal também fez um contrato com a Coopérdia, que é uma das afiliadas da Aurora Alimentos, com garantia de preço, entre R$ 15 e R$ 17 por leitão produzido. Com isso, garante renda para pagar o investimento e ainda sobrar no final do mês.
– Não tem risco – comemora.
O presidente da Cidasc, Enori Barbieri, considera que só sobreviverá quem estiver ligado às agroindústrias.