Crise
assombra o Oeste
DARCI
DEBONA
Produtores
estão abandonando a atividade e 10 cidades decretaram situação de
emergência
Criadores com suínos gordos sem ter para quem vender, criadores chorando por ter que abandonar a atividade que exerciam há décadas, gente com dívidas que não consegue pagar, chiqueiros que estão sendo transformados em estufa, galinheiro ou então depósito e municípios decretando situação de emergência.
Criadores com suínos gordos sem ter para quem vender, criadores chorando por ter que abandonar a atividade que exerciam há décadas, gente com dívidas que não consegue pagar, chiqueiros que estão sendo transformados em estufa, galinheiro ou então depósito e municípios decretando situação de emergência.
Esta é
a realidade da suinocultura catarinense, uma das principais atividades
econômicas do Estado, que somente em exportações movimentou US$ 452 milhões no
ano passado.
A
situação da família Altenhofen, de Xavantina, é desesperadora. Eles acumulam uma
dívida de R$ 200 mil com a criação e agora estão vendendo a terra. No mês
passado, Natalino Altenhofen entregou as 80 reprodutoras por um real ao quilo,
pois não tinha mais milho para alimentar os animais. Sobraram quatro porcas de
descarte e oito vacas de leite, que dão o sustento para a
família.
Um
filho que ajudava na criação foi trabalhar de empregado em outra propriedade. A
filha Rosane, que ainda está em casa, pensa em ir trabalhar de diarista ou numa
padaria. E o casal Natalino e Rosália tenta vender a propriedade por um valor
que, pelo menos, cubra as dívidas.
–
Senão vamos pra debaixo da ponte – afirma Altenhofen, que está com 65 anos e
ainda enfrenta problema de saúde em um olho e nos rins.
Nas
últimas duas semanas, 10 municípios decretaram situação de emergência: Braço do
Norte, Seara, Xavantina, Grão Pará, Arroio Trinta, São Ludgero, Salto
Veloso, Lindoia do Sul, Orleans. Ontem foi a vez de Concórdia decretar
emergência. Outros municípios estudam a mesma medida.
Os
decretos precisam ser reconhecidos pela Defesa Civil, mas o principal objetivo,
segundo o secretário de Agricultura de Concórdia, Márnio Cadore, é dar apoio aos
produtores e sensibilizar as autoridades, pois as perdas do setor impactam
também na economia destes municípios, com reflexo no comércio e na
arrecadação.
– O
primeiro impacto é no social, mas depois começa a influenciar na arrecadação –
explica o secretário de Agricultura de Seara, Fred Müller.
– Se o
governo não der uma mão, a suinocultura está com os dias contados – sentencia o
produtor Sigmar Ruppenthal, que está com cerca de 700 leitões e não consegue
vendê-los.
Ele
entregava os animais com oito quilos e alguns já estão com quase 40
quilos.
–
Ninguém quer – lamenta.
Ruppenthal
vendeu suínos a R$ 2,50 por quilo há um ano e, recentemente, negociou algumas
reprodutoras a R$ 0,94 por quilo. Ele diz que as economias que tinha acumulado
se foram, pois a despesa mensal na criação é de R$ 28 mil a R$ 30
mil.
O
suinocultor Moacir Mattielo decidiu que vai terminar com a criação. Ele tinha 70
porcas e restam apenas 30, que devem ser vendidas até o final do
ano.
– Não
tem mais o que fazer – decreta.
Seu
filho, que ajudava na criação, foi trabalhar na cidade de Seara. E um dos
chiqueiros que Mattielo tinha está sendo desmanchado.
– Vou
fazer uma estufa para cultivar tomate – diz.
Para o
diretor da Embrapa Suínos e Aves, de Concórdia, Dirceu Talamini, o aumento na
produção nacional e o excesso de suínos no mercado, aliados às restrições da
Argentina, fizeram o preço despencar. Por outro lado, os custos de milho e soja
aumentaram muito. A Embrapa calcula o custo em R$ 2,57 por quilo, para uma
remuneração de R$ 1,90.
O
presidente da Associação Catarinense dos Criadores de Suínos, Losivânio de
Lorenzi, afirma que SC já teve 70 mil suinocultores na década de 1970 e hoje tem
cada vez menos. Só neste ano, 240 produtores desistiram. O setor pede ao governo
federal a renegociação de dívida e financiamento de R$ 500 por matriz para
manter os plantéis. Também querem subsídio de 67 centavos por quilo de suíno
vendido, que é a diferença entre o custo e o preço de
mercado.
Saída
é transferir a criação
A cada
crise, Santa Catarina vai perdendo produtores especializados na criação de
suínos. Alguns abandonam a atividade, outros vão tentar a sorte longe de casa. É
o caso de Adair Cella, que há cinco anos fechou os chiqueiros em Chapecó, onde
tinha 200 fêmeas que produziam 4 mil leitões por ano. Ele e mais seis sócios,
sendo cinco do Oeste de Santa Catarina e dois que estavam no Mato Grosso,
montaram uma granja de suínos em Tapurah (MT).
Foram
investidos R$ 30 milhões na estrutura, que abriga 170 funcionários e uma
produção de 324 mil suínos por ano. Cella diz que a opção foi em virtude das
dificuldades ambientais e custo de produção, já que o milho é mais barato no
Centro-Oeste.
Modelo
está com os dias contados
Além
disso, no Mato Gosso o modelo de produção é diferente. Em Chapecó, ele era
responsável pelos insumos e lá a remuneração é por leitão produzido, sendo que
os insumos e assistência técnica são bancados pela
agroindústria.
Ele vê
que o antigo modelo de produção familiar, em pequena escala, não sobreviverá. Na
comunidade de Colônia Cella, onde continua morando com a família, Adair lembra
que, em menos de 10 anos, restaram apenas cinco dos mais de 20 criadores de
suínos da região.
– Se
eu tivesse ficado aqui, teria fechado igual o chiqueiro –
lembra.
Chiqueiro
vira loja de roupa
A
estrutura de uma propriedade modelo na criação e suínos na década de 1970, na
Linha Fragosos, em Concórdia, atualmente serve para outro tipo de criação:
roupas de moda.
A
granja foi desativada há mais de duas décadas, em outra crise da suinocultura.
Até que, em 2008, o casal de administradores Odílio Lins Júnior e Mônica
Brancher Lins decidiu transformar as pocilgas numa fábrica. Eles tinham
indústria e quatro lojas em Florianópolis, onde pagavam R$ 12 mil de aluguel por
mês.
Odílio
decidiu utilizar os chiqueiros abandonados pelo seu pai para produzir novamente.
Onde era a maternidade dos porquinhos, foram retiradas as baias e instalada uma
loja.
Estilo
rústico atrai os clientes
A
estrutura das paredes e o teto permanecem, o que alia o rústico à leveza das
peças vendidas no local.
– Os
clientes adoram – diz Mônica.
Em
outro galpão que servia para criação fica a sala de cortes, não de carnes, mas
de tecidos. Os troféus que o sogro de Mônica conquistou na produção agropecuária
agora servem de peso para os moldes de papel.
O que
foi considerado loucura por amigos, só trouxe benefícios. Como eles moram ao
lado da indústria, podem atender melhor aos dois filhos, e a produção, em vez de
minguar, triplicou. O Grupo Lemon, que tinha 11 colaboradores em Florianópolis,
agora conta com 24. E, neste mês, deve abrir uma loja da marca Maria Catarina em
Chapecó. Se o porco não estava mais dando lucro, a produção de roupas vai muito
bem.
CONCÓRDIA
Investir
para ganhar em escala
Enquanto
muitos suinocultores estão reduzindo o plantel ou até desistindo da atividade, o
produtor Marcos Ruppenthal está fazendo o caminho contrário: investiu R$ 700 mil
no aumento da produção.
– É no
momento da crise que tem que investir – aposta o criador de suínos de
Arabutã.
Ele
tinha 140 matrizes reprodutoras de suínos e, até o final do mês, já terá 500.
Desta forma, a produção de leitões vai quase quadruplicar. Para isso, ele teve
que construir dois chiqueiros automatizados e novos sistema de tratamento de
dejetos. Metade do dinheiro investido é de recursos próprios, e o restante, é
financiado.
Adaptação
a uma nova realidade
O
suinocultor explicou que não está cometendo nenhuma “loucura”, e sim se
adaptando a uma nova realidade do mercado. Antes, os suínos eram dele, que era
responsável por todas as despesas. Pelo novo sistema, todos os animais são da
agroindústria e é ela a responsável por fornecer a ração, medicação e transporte
dos animais. O produtor só alimenta e cuida dos animais.
O
vice-presidente da Aurora Alimentos, Neivor Canton, disse que cerca de 90% dos
3,2 mil suinocultores da cooperativa já estão nesse sistema, que é denominado
“vertical”.
– Só a Aurora tem mais de 1 milhão de suínos – calcula.
– Só a Aurora tem mais de 1 milhão de suínos – calcula.
Ruppenthal
também fez um contrato com a Coopérdia, que é uma das afiliadas da Aurora
Alimentos, com garantia de preço, entre R$ 15 e R$ 17 por leitão produzido. Com
isso, garante renda para pagar o investimento e ainda sobrar no final do
mês.
– Não tem risco – comemora.
– Não tem risco – comemora.
O
presidente da Cidasc, Enori Barbieri, considera que só sobreviverá quem estiver
ligado às agroindústrias.